sexta-feira, 9 de setembro de 2011

PROGERIA, DOENÇA RARÍSSIMA

PROGERIA, DOENÇA RARÍSSIMA QUE ENCURTA A VIDA DAS CRIANÇAS

Raríssima e sem cura, a progéria faz crianças envelhecerem muito mais rapidamente do que o normal. Nos casos mais graves, a expectativa de vida é de, no máximo, 13 anos. Brasil tem três dos 63 casos já identificados no mundo


 

No segundo semestre de 2002, o cabelo de Michiel começou a rarear e cair. Em pouco tempo, estava completamente careca. Ele tinha bolsas sob os olhos e, como todo idoso em idade avançada, sua pele ficou tão frágil que era possível visualizar as veias sob a fina camada. Michiel, contudo, tinha apenas 4 anos. Hoje, com quase 12, o menino — que vive na Bélgica — é uma das 63 pessoas do mundo a ter uma doença raríssima, que provoca o envelhecimento acelerado e precoce, a progéria — ou síndrome de Hutchinson-Gilford.

A doença chamou a atenção depois que o site da agência britânica BBC divulgou a história de um garoto de 11 anos, Harry Crowther, portador da forma mais amena do mal. Os casos são tão raros que há escassez de informação, mesmo no meio médico, sobre o problema. No Brasil, não há dados oficiais, mas a organização não governamental de pesquisa americana Progeria Research Foundation (PRF) já detectou a existência de três pacientes — um na Paraíba, um no Ceará e outro em São Paulo. O Correio também localizou a mãe de uma criança de 2 anos, que morreu há oito meses, em Breu Branco, no interior do Pará, vítima da doença.

A progéria foi descrita pela primeira vez no século 19 por dois médicos ingleses, mas somente em 2003 um grupo de cientistas da PRF anunciou que havia isolado o gene mutante LMNA, responsável pela doença. Apesar do avanço significativo, os médicos ainda não conseguiram encontrar a cura — nem mesmo há um remédio específico para a doença. O que se sabe é que a síndrome é fatal, levando à morte ainda na adolescência (veja arte).

A estimativa é que nasça um bebê com o problema em cada 8 milhões, o que significaria a existência de um número de casos pelo menos 10 vezes maior, atualmente. “Ainda não conseguimos identificar todas essas crianças devido à raridade da doença. Muitas pessoas nunca viram uma criança com progéria e por isso não identificam os sintomas. Mas é preciso aumentar a consciência sobre o problema, principalmente em países em desenvolvimento”, alerta Audrey Gordon, diretora executiva e presidenta da Progeria Research Foundation. “Acreditamos que a dificuldade de diagnosticar crianças com progéria está relacionada a essa desinformação. Uma vez que as pessoas veem fotos dessas crianças, elas imediatamente reconhecem se há alguém em sua comunidade que possui o problema, por causa da similaridade da aparência dos pacientes”, afirma.

De acordo com Gordon, atualmente, o tratamento é focado nos cuidados com os sintomas, como acompanhamento nutricional devido ao baixo teor de gordura corporal, prescrição de medicamentos à base de acetilsalicílico para prevenção de doenças cardíacas e terapia ocupacional e física. “Nos últimos anos, a PFR tem centralizado as pesquisas sobre a progéria e temos uma grande esperança de conseguir desenvolver um tratamento e até descobrir a cura da doença”, diz.

Bebês assintomáticos
Ao nascer, o bebê não apresenta qualquer traço da progéria. As características só vão aparecer por volta dos 18 meses de vida e, aos 2 anos, já estão bastante aceleradas. Michiel Vandeweert nasceu em 13 de junho de 1998 e parecia um bebê normal, embora tivesse três manchinhas no rosto e uma pele muito seca. Com o passar do tempo, o casal Godelieve e Wim começou a se preocupar. “Ele não comia muito bem e ganhava muito pouco peso”, relata Godelieve, que, juntamente com o marido, criou um site para o filho. “Há um momento em que a intuição materna diz que há algo errado com seu filho. Ele tinha 4 anos, media 92cm e pesava 9kg. Durante três anos, essas características mantiveram-se as mesmas”, conta Godelieve. Pesquisando na internet, os pais do menino encontraram um caso parecido. Peregrinaram por consultórios e, enfim, antes de Michiel completar 5 anos, tiveram o diagnóstico.

Em 2006, o casal descobriu que a filha de 2 meses também era portadora da síndrome. Há dois anos, Michiel participa dos testes clínicos em Boston, nos Estados Unidos, de uma nova droga que visa retardar os sintomas da doença, desenvolvida por pesquisadores da PRF. O menino faz parte de um grupo de 28 crianças que recebem o tratamento. “Ele já cresceu 5cm, suas veias estão menos finas e a pele está mais sólida”, comemora Godelieve.

Já o pequeno David de Souza, nascido em Breu Branco (PA), não teve a mesma sorte. Ele morreu há 8 meses, antes de completar os 3 anos de idade. A criança apresentou cedo os sinais da progéria. Nas ruas da pequena cidade, de 47 mil habitantes, ele era ridicularizado por causa da aparência. A família humilde não teve condições de rodar o Brasil e o mundo atrás de tratamento. O máximo que conseguiu foi viajar até Belém, a cerca de 400km. Lá, Cleane de Souza e José Ildo de Souza Costa chegaram a pensar que o menino poderia ser curado.

Devido a uma pneumonia, David ficou internado por três meses na Santa Casa de Misericórdia, na capital. Quando recebeu alta, a família voltou a Breu Branco. Passados alguns dias, David teve uma recaída e foi internado no hospital público da própria cidade. “Ele parecia que estava bem. Cheguei lá no dia seguinte e ele estava morto. A médica sumiu, disseram que tinha viajado, e ninguém me falou nada. O corpo dele já estava liberado para o enterro. Não me conformo, não vou me conformar nunca”, diz. Semianalfabeta, Cleane não consegue entender a causa da morte. Na certidão de óbito, consta infecção pulmonar. “Como meu filho pode ter morrido por causa de uma gripezinha?”, questiona. Em casa, ela não se desfez dos objetos pessoais de David. “Guardei tudinho, todas as coisinhas dele. Toda hora eu sinto falta do meu filho.”

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